Em entrevista à BBC News Brasil, Isabely Mota, uma das criadoras do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), comemora recorde de adoções e reintegrações em 2021, mas lamenta número alto de adoções interrompidas por devoluções de crianças aos abrigos.

Mesmo com toda preparação, tem as devoluções.

A lei determina que toda pessoa ou família interessada em adotar deve procurar o sistema judiciário, por meio das Varas de Infância e Juventude e do pré-cadastro no SNA. No processo, ocorre a chamada habilitação para adoção, uma preparação com cursos e atendimento psicossocial para orientar as famílias pretendentes sobre eventuais dificuldades e ações que podem ajudar na educação da criança ou adolescente a ser adotado.

“Durante muitos anos, se viu a adoção como caridade. A adoção não é isso. Esses cursos (preparatórios) são importantes para desconstruir esses mitos da adoção. Para desconstruir o mito do amor maternal inato; o mito de que só é possível construir vínculos na primeira infância; ou que a criação feita não pode ser desfeita”, enumera a pesquisadora.

“As pessoas chegam com muitos preconceitos, então a gente precisa desse período de preparação. Não é um tempo para deixar a pessoa esperando: é uma necessidade.”

“E mesmo com toda essa preparação, a gente ainda tem as devoluções”, lembra Mota, referindo-se a processos de adoção que foram iniciados e acabaram interrompidos, com a criança voltando para um abrigo.

Segundo dados inéditos passados por Mota à BBC News Brasil, com base em informações do SNA, em 2021, 8,7% dos processos de adoção iniciados — ou seja, a partir do momento em que a criança saiu do acolhimento para morar com a família adotiva, em estágio de convivência — levaram à devolução do menor de idade. No ano passado, isso ocorreu em 363 das 4.183 adoções iniciadas; em 2020, em 401 das 4.609 adoções iniciadas (também 8,7%).

“Muitos juízes de infância ainda acham alto esse número. Porque você tem pessoas (pretendentes) que estão sendo treinadas, habilitadas. Mesmo preparando, tem esse número. Se a gente não fizesse toda essa preparação, seria muito pior. É o que acontecia no passado: tinha muito mais devoluções porque a preparação não era bem feita”, explica a pesquisadora, que percorreu mais de 20 Estados para ajudar na implementação do SNA.

“Não é culpabilizar o pretendente, mas a gente vê casos que realmente as pessoas não estão preparadas para assumir a maternidade e a paternidade. A gente vê devolução de bebês porque o bebê chora demais, porque ele não deixa dormir à noite”, exemplifica.

“Para a criança (devolvida), é um novo abandono.”

“É muito importante que a pessoa que vai adotar se informe, conheça outras pessoas que estejam passando ou já passaram pelo processo… Precisamos de pessoas responsáveis para fazer a adoção no Brasil.”

Dados preliminares de 2022 mostram que, até agora, o percentual de devoluções está mais baixo: 3,8%, ou 62 das 1.613 adoções iniciadas.

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